Esta semana tive o prazer de entrevistar o músico, cantor e compositor Chico Rodrigues.
Para quem não sabe, Chico foi vocalista da banda Calvin (na minha humilde opinião, uma das melhores bandas de rock alternativo de Santa Catarina), que infelizmente encerrou seus trabalhos em 2012.
Posso dizer que fiquei MEGA FELIZ quando recebi uma resposta positiva e bem humorada ao convite que fiz (porque antes de tudo ainda sou fã da Calvin) e também pelas respostas tão cheias de verdade e sentimentos (sim, SENTIMENTOS) de Chico Rodrigues.
Chico Rodrigues |
Confiram a entrevista:
Cena Underground BR- Em Dezembro de 2012, a Calvin anunciou os shows que marcariam o encerramento das atividades da banda. Quais os motivos que levaram a banda a tomar esta decisão?
Chico Rodrigues- Quando
acabamos as gravações do “O albatroz”, eu já sentia uma sensação de ter
completado um trabalho que havia começado com o primeiro EP. Eu não sabia muito
bem o que gostaria de fazer em um próximo trabalho, embora continuasse compondo
algumas músicas. Então, quando meu irmão (que tocava teclado na banda na época)
anunciou que não conseguiria mais acompanhar a banda no ano seguinte, conversei
com o Denis e o Duka (baixista da época) e achamos melhor encerrar as coisas do
jeito que estavam. Também conta o fato de que eu era literalmente louco pela
banda, o que em determinada altura já não me fazia bem. Eu nunca aprendi a não
pensar na Calvin o tempo todo. Em certo ponto, em meio a cada vez menos
festivais autorais e com toda uma cena dominada pelas bandas tributo e covers,
percebi que fazia tempo demais que eu perdia o sono com coisas que eu nunca
poderia mudar, e que precisaria me forçar a desapegar disso.
Cena Underground BR- Quais
são as maiores lições que ficaram destes anos de Calvin?
Chico Rodrigues- Aprendi
que compensa ser leal à sua criação. Atravessamos a fase em que a cena
underground brasileira mais lotou lugares e mais atraiu a grande mídia. Todas
as bandas estavam recebendo mais atenção, e a tendência quando se conquista
isso é fazer de tudo pra conseguir mais sucesso. Quando a Nx Zero e Fresno
assinaram com uma gravadora, foi uma loucura, a grande maioria das bandas
passou a se vestir, tocar, e escrever
sobre as coisas que achavam que conquistaria o grande público ou chamaria a
atenção do Rick Bonadio. Das centenas de bandas que tentaram seguir uma fórmula
do sucesso, talvez cinco ou seis ainda colham algum fruto disso hoje em dia, e
creio que todas as outras provavelmente não se orgulham do que produziram nessa
época. A Calvin atravessou isso com um senso de integridade musical intacto,
sempre tomamos as decisões que pareciam
certas para com nossas músicas. Comecei a banda aos 14 anos e encerrei aos 28,
e não existe sequer uma linha composta - seja ela boa ou ruim - que me envergonhe hoje em dia. Um
dia, poderei mostrar qualquer uma dessas músicas para alguém de quem eu goste e
dizer: esse era eu tocando com meus grandes amigos, e essa letra fala
exatamente de como eu me sentia.
Cena Underground BR- O
site TramaVirtual (que saiu do ar no ano passado) se tornou uma grande
comunidade de bandas independentes, que inovou o cenário e ajudou a dar
visibilidade a muita gente. Qual a importância deste site e dos blogs para o
trabalho de divulgação da Calvin?
Chico Rodrigues- Esses
veículos deram às bandas as condições necessárias para levantar o dedo médio
pra todo mundo e fazer as coisas do seu jeito. De repente, você não precisava
mais de rádio e nem do disco emprestado de um amigo pra conhecer um som. A
internet possibilitou o que antes era impensável. Lembro que após gravarmos
nosso primeiro EP, fizemos shows em Minas Gerais e em São Paulo sem nunca ter
tocado em Blumenau, que era nossa cidade vizinha.
Cena Underground BR- Em
algum momento você pensou em desistir da música?
Chico Rodrigues- Difícil
responder essa pergunta, porque eu nunca tentei viver disso. Sou filho de um
músico muito mais talentoso que eu, e sempre fui alertado da ingratidão do meio
artístico. Meu foco sempre foi compôr e fazer shows sem esperar nada em troca a
não ser respeito, a adrenalina de subir num palco com uma banda de rock, e o
barato de ouvir alguém dizendo que curtiu o seu som. Então, nunca estive em
posição de desistir da música, minha relação com ela já nasceu meio platônica e
incondicional.
Cena Underground BR- Em
sua opinião, a cena underground mudou muito em relação à época em que a Calvin
começou? Quais foram essas mudanças?
Chico Rodrigues- Sim.
Tudo mudou no dia em que o Fantástico avisou o Brasil que existiam pessoas com
franjas que choravam nos shows e se entitulavam “emos”. Antes, uma banda que
falasse de amor abria o show do Dead Fish, do Garotos Podres. O público
underground era um só, unido e poderoso. Depois daquilo, neguinho tinha medo de
ir em show de hardcore, pra não ser chamado de viado. O público do underground
foi dividido em inúmeras facções, e os idiotas que não queriam ser associados a
um rock que falasse de sentimentos foram ajudar a lotar casas onde as bandas
cantavam sobre “a fada querida, dona da minha vida”, o “meteoro da paixão”, e
outros exemplos de “música pra macho”. Depois disso, a cena underground nunca
mais foi a mesma. Em alguns estados, como SC, ela se extinguiu quase que
completamente. O mais preocupante é que, por falta de bandas independentes na
ativa para servir de modelo, essa molecada que está começando a montar bandas
talvez passe a vida inteira adorando um pôster na parede ao invés de fazer suas
próprias músicas.
Banda Calvin |
Cena Underground BR- Atualmente
você toca na banda Gulliver. Conte-nos como surgiu esse projeto.
Chico Rodrigues- Uns
seis meses após o fim da Calvin, o Billy (nosso primeiro baixista e que tocou
com a banda até 2011) chamou o Kaiser (ex-tecladista) e o Denis pra tocar
alguns covers de indie e rock alternativo com ele. Com o miolo já formado, me
procuraram e pediram se eu gostaria de cantar e tocar guitarra na banda. Como
somos amigos há anos, eu sabia que eles nunca me pediriam pra tocar uma música
sequer da qual eu não gostasse. Então respondi que não queria tirar músicas na
guitarra, mas que cantaria numa boa, já que adoro essas bandas e já sabia a
maioria das músicas de cabeça. E foi isso, passamos a nos reunir pra tocar e
tomar umas cervejas. Tocar com a Gulliver é um passatempo entre amigos, meu
passatempo preferido.
Cena Underground BR- Quem
conheceu suas composições na Calvin sabe que você é um compositor de “mão
cheia”. Então existe a possibilidade, de futuramente, a Gulliver lançar um
trabalho autoral?
Chico Rodrigues- Obrigado,
fico feliz que ache isso. Mas então, compor com a Gulliver está fora de
questão. A banda toda é de ex-membros da Calvin, seria simplesmente estranho
voltar a fazer isso com outro nome. Além do fato que sempre achei muito desconfortável tocar uma música autoral no meio
de um repertório de covers, é sempre aquela condescendência, aquelas cabeças
acenando forçadamente em aprovação, mas no fundo ninguém se importa. Mas
atualmente componho para um projeto 100% autoral, chamado Havana Hookers. É um
power trio de hardcore melódico em inglês e nos moldes californianos, em que
toco guitarra e divido os vocais com o Tiago da Display, que também assumiu o
baixo, e o Denis, que continua sendo o baterista de todas as bandas em que
toquei na vida. Eu e o Tiago escrevemos 10 músicas em parceria, e metade já se
aproxima de sua versão final, trabalhada com a banda toda. Esperamos gravar o
disco de estréia ainda esse ano, estamos extremamente felizes com o resultado
até agora e de olho no futuro.
Cena Underground BR- Quais
as dicas que você daria para quem está começando agora na música?
.
Chico Rodrigues- Não
confie em nenhum idiota que disser que por não sei quantos reais irá “gravar,
fazer o clipe, produzir e agenciar” a banda de vocês, ele provavelmente vai
sumir com a grana ou entregar um trabalho porco e atrasado. Espero que vocês
adorem coxinha e comida de posto, porque vocês vão comer muito disso. E sofás
são tão confortáveis quanto uma cama se você estiver bêbado o bastante.
Cena Underground BR- Deixe
um recado para a equipe e para os leitores do Cena Underground BR.
Chico Rodrigues- Agradeço
à equipe do blog por ter me procurado, fico feliz em saber que lembram da
Calvin. Gurizada, não deem bola pra uma palavra do que eu disse, eu sou velho,
e velho nunca sabe de porra nenhuma.
Para quem ainda não conhece as músicas da Calvin ou quer matar a saudade, é só clicar no link abaixo, ouvir e baixar à vontade.
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